com Jorge Campos e Sérgio C. Andrade sobre o filme Adeus, Até ao Meu Regresso (Portugal, 1974, 70'), de António-Pedro Vasconcelos.
Em X-RAYDOC faz-se a análise de flmes cuja importância seja indiscutível para uma História do Documentário na qual se releva, como elemento estruturante, a relação com o outro, em contexto. Esta relação tem consequências a diversos níveis, desde logo no plano das soluções narrativas plasmadas em função de critérios quer de ordem ética quer de ordem estética. Daí que, sendo o real - a matéria prima do documentário - feito de mudança, resulte uma multiplicidade de declinações combinatórias, praticamente infinita, inevitável num cinema que interpela o seu tempo e quem o habita. É esse o domínio do olhar. Portanto, de toda uma teoria. Há documentários que influenciaram o desfecho de guerras, levaram à absolvição de condenados à morte, lançaram nova luz sobre adquiridos, denunciaram situações insustentáveis, mudaram a vida de milhares de pessoas. Há documentários que mudaram o próprio cinema. X-RAYDOC inscreve-se no quadro desta singularidade, procurando ir mais além.
Este não é um dos filmes mais conhecidos de António-Pedro Vasconcelos. Atrevo-me a dizer, no entanto, que é dos mais interessantes. Exibido pela primeira vez no Natal de 1974, na RTP, no mesmo espaço onde durante anos foram exibidas as chamadas mensagens à família dos soldados destacados em África, Adeus, até ao meu regresso foi o primeiro filme português a abordar a temática da guerra colonial. Se outro mérito não tivesse, esse, só por si, seria bastante para o recomendar. Mas Adeus, até ao meu regresso vai além disso. António-Pedro Vasconcelos andou pelo país à procura de ex- combatentes com presença nos programas natalícios do Estado Novo na RTP. Encontrou-os nas suas aldeias absorvidos nas actividades do dia a dia e descobriu histórias cuja espessura dramática permitiu trazer à superfície quer a complexidade do presente de então, em 1974, quer da guerra que vitimou milhares de jovens. Isso mesmo foi relevado em diversas publicações, entre as quais, os Cahiers du Cinéma.
Jorge Campos
"Realizado para televisão em Dezembro de 1974, ADEUS, ATÉ AO MEU REGRESSO adopta a expressão utilizada pelos soldados portugueses quando, do teatro de guerra, enviavam as suas mensagens de Natal para a metrópole, como então também se dizia. Há testemunhos impressionantes, como o de um ex-combatente que relata as dificuldades sentidas pelos soldados para pagarem as urnas dos colegas mortos, ou a carta lindíssima de um outro que, em 1965, descrevia à mulher a falta de sentido da guerra. António Pedro Vasconcelos regista as palavras destes soldados que combateram na Guiné reflectindo sobre a guerra colonial portuguesa quando esta era ainda uma realidade muito presente."
Fonte: Cinemateca
Doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade de Santiago de Compostela, especialista em Cinema Documental, professor do Ensino Superior, jornalista, cineasta e programador cultural. Como jornalista trabalhou na Imprensa, Rádio e Televisão, designadamente na RTP, onde esteve 25 anos. Realizou vários documentários e foi o Programador responsável pela área de Cinema, Audiovisual e Multimédia do Porto 2001 – Capital Europeia da Cultura, bem como do ciclo de Fotografia e Cinema Documental Imagens do Real Imaginado do Instituto Politécnico do Porto. Anima o blogue narrativas do real.
Licenciado em Filosofia (Universidade do Porto); professor do ensino secundário (1979-88). Jornalista profissional desde 1988, com carreira em O Primeiro de Janeiro (1988-89) e PÚBLICO (desde 1989); colaborador n’O Comércio do Porto, Expresso e Grande Reportagem; co-fundador das revistas Cinema Novo e A Grande Ilusão. Autor dos livros O Porto na História do Cinema (2002), Ao Correr do Tempo – Duas Décadas com Manoel de Oliveira (2008) e Serralves – 20 Anos e Outras Histórias (2009). Autor do documentário Manoel de Oliveira, O Caso Dele (2007). Co-autor do Dicionário de Personalidades Portuenses do Século XX (2001) e de As Casas da Música no Porto – Vols. I, II e III (2009-2011).